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Duas Maternidades

Dentre as leis que regem a estética do universo, participa a dos “contrastes harmônicos”. Ao pintar um quadro, por exemplo, combinamos cores as quais, muitas vezes, são opostas a princípio, mas que se associam posteriormente a ponto de produzir verdadeiras obras de arte. Com relação à alma dos santos, analogamente, tal fenômeno também se realiza.

Como exemplo desta regra, posto em fatos na vida de Maria Santíssima, dois são os episódios que podemos destacar da presente semana que segue o seu curso.

Num deles, a alma d`Ela, a bem dizer, nunca esteve tão cheio de gáudio (ao menos nesta terra), vendo-se tomada de entusiasmo, no sentido literal da palavra, merecendo do próprio arcanjo São Gabriel uma inestimável saudação: “Ave Maria, gratia plena, Dominus Tecum”(Lc 1,28).

Trata-se da Anunciação, solenidade comemorada neste mês de março (dia 25), ocasião em que, por obra do Espírito Santo, as virtudes de Maria alcançaram-nos a vinda de Cristo para a nossa Salvação. Ela que queria ser a escrava da mãe do Messias, achou graças diante de Deus, quem a escolheu como Aquela que o geraria.

Neste sentido, ensina-nos São Bernadino de Sena, que “Toda graça que é comunicada a esta terra passa por três ordens sucessivas. De Deus é comunicada a Cristo, de Cristo à Virgem, e da Virgem a nós” (S. Bernardino de Sena, Sermo VI in Festis B. M. V., De Annunciatione, a. 1, c. 2). Completa ainda o Doutor Angélico, ao afirmar que “Por meio da Anunciação, aguardava-se o consentimento da Virgem, em nome e em representação de toda a natureza humana”(S. Tomás, 3, q. 30, a. 1).

 

Entretanto, após aproximadamente 33 anos, este gáudio extraordinário que teve por ápice, por certo, a noite de Natal, se alternaria a um paradoxo inimaginável: o Filho Bendito de suas Virginais Entranhas, que tantas vezes trouxera piedosamente em seus braços, se vê todo chagado e desfigurado na hora derradeira em que fora descido da Cruz!

Ó alegria da Anunciação… Oh! Tristeza e dor da Paixão! Que contraste harmônico magnífico marcou a alma d`Ela, o qual nos convida à presente reflexão: qual dos dois lances merece maior louvor?

No primeiro, “O Verbo se fez Carne e habitou entre nós” (Jo 1,14). Como pensar algo mais santo e sublime?

No entanto, ensina-nos a Doutrina Católica que após a crucifixão, a fé da Igreja foi sustentada exclusivamente por Nossa Senhora, dado que somente Ela cria piamente na Ressureição.

Apresenta-se, então, sua “segunda maternidade”, uma vez que além de ser Mãe de Cristo, cabeça da Igreja, é também Mãe dos homens, corpo místico da Igreja.

Leão XIII, em sua Carta Encíclica Octobri Mense, assegura-nos de tal modo o papel da Virgem enquanto Mãe, que de suas próprias palavras, destacamos:“Tal no-la deu o próprio Deus, que, havendo-a escolhido para Mãe de seu Unigênito, infundiu-lhe, por isso mesmo, sentimentos requintadamente maternos, capazes somente de bondade e de perdão. Tal no-la mostrou Jesus, quer quando consentiu em ser sujeito e obedecer a Maria, como um filho a sua mãe, quer quando, do alto da Cruz, confiou às suas amorosas solicitudes todo o gênero humano, na pessoa do discípulo João. Tal, enfim, se mostrou ela mesma quando, acolhendo generosamente a pesada herança que lhe deixava seu Filho moribundo, desde aquele momento começou a cumprir, para com todos, os seus deveres de Mãe.”

Enfim, eis aqui apenas uma visão deste maravilhoso e insondável caleidoscópio das virtudes de Maria, que a fazem, devotamente, Mãe de Deus e da Igreja, Rainha e medianeira de todos nós. Saibamos, pois, proclamar como em Éfeso, o título Theotokos de Maria bem como recorrer sempre a Ela, inspirados para isso na Sagrada Liturgia:“Mostra-te nossa Mãe, e por meio de ti acolha nossas preces Aquele que, nascido para nós, quis ser teu Filho”.

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