Salve, Rainha, Mãe de misericórdia,
vida, doçura e esperança nossa, salve!
A Vós bradamos, os degredados filhos de Eva. A Vós suspiramos, gemendo e chorando neste vale de lágrimas.
Eia, pois, advogada nossa, esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei.
E depois deste desterro mostrai-nos Jesus, bendito fruto do vosso ventre, ó clemente, ó piedosa, ó doce e sempre Virgem Maria.
V. Rogai por nós, Santa Mãe de Deus.
R. Para que sejamos dignos das promessas de Cristo
“Vida, doçura e esperança nossa, salve!”
Implorando à Nossa Mãe Santíssima que nos conceda graças especiais, vamos avançando na meditação desta magnífica oração da Salve, Rainha, objetivando que ela seja rezada com devoção cada vez maior e que constitua para cada um em particular um doce hino de louvor prestado à Rainha do Céu e da Terra.
Nas invocações desta segunda frase, a Igreja nos convida, em primeiro lugar, a chamarmos nossa Rainha de vida. Sendo assim, consideremos o significado desta invocação. Quando começa, de fato, a nossa “vida”? Em termos naturais, pode-se afirmar que a vida começa no momento da concepção, embora correntes não-católicas queiram considerar que a vida se inicia apenas em certas etapas do desenvolvimento do embrião ou feto, ou mesmo, apenas no momento efetivo do nascimento da criança. Com efeito, conforme ensina o Catecismo da Igreja Católica, “a vida humana deve ser respeitada e protegida de maneira absoluta a partir do momento da concepção”(1)
Porém, muito mais importante que o começo de nossa vida natural, física, é o início da nossa verdadeira vida (no sentido mais pleno da palavra, sob o ponto de vista católico), que começa no momento de nosso Batismo, o qual para nós “é a fonte da vida nova em Cristo, fonte esta da qual brota toda a vida cristã”(2). Se compreendermos, portanto, que a verdadeira vida vem da graça de Deus, e que Maria Santíssima é a Mãe da Divina Graça, fica fácil compreender por que a Igreja nos recomenda chamá-la, nesta oração, de vida. Muito claramente trata Santo Afonso de Ligório a respeito deste ponto:
“Para a exata compreensão da razão por que a Santa Igreja nos ordena que chamemos a Maria nossa vida, é necessário saber que, assim como a alma dá vida ao corpo, assim também a graça divina dá vida à alma. Uma alma sem a graça divina só tem nome de viva, mas na realidade está morta (…) Obtendo Maria por meio de sua intercessão a graça aos pecadores, deste modo lhes dá vida”.(3)
Ou seja, uma pessoa que esteja privada da graça da Deus, não tem em si a vida verdadeira; tem apenas uma aparência de vida. Portanto, se tivermos a infelicidade de pecar ofendendo a Deus gravemente, perdendo a vida da graça em nós, rapidamente procuremos o Seu perdão, para recobrar a vida plena. Como nos ensinam os santos, procuremos Maria, para que Ela nos obtenha de volta a nossa vida, que é Jesus Cristo!
Além de nos obter de volta a nossa vida quando pecamos, Maria Santíssima também nos obtém a graça da perseverança: mantém acesa em nós a chama da vida da graça.
Maria Santíssima é também nossa doçura.
No Tratado da Verdadeira Devoção, S. Luís comenta que “nossas melhores ações são ordinariamente manchadas e corrompidas pelo fundo de maldade que há em nós” (4), portanto ao fazermos um sério e rigoroso exame de consciência, ao analisarmos detidamente como tem sido nossa vida até hoje, reconhecemo-nos inteiramente necessitados do perdão e da misericórdia de Deus. Por vezes, pode assaltar-nos um sentimento de temor diante de nossas misérias e pecados. Qual será nosso destino eterno se não nos convertermos verdadeiramente? A vista da sentença do juiz e do grave “apartai-vos de mim” (cf. Lc 13,27) pode – e deve – fazer-nos tremer de pavor.
Mas, qual não deve ser o nosso consolo, a nossa confiança, ao pensarmos na doçura de nossa Mãe Santíssima, que intercede por nós junto ao Juiz, que é seu próprio Filho? Como auxílio de Maria, nada devemos temer, pois é Ela “perfeitamente afável, doce, misericordiosa e condescendente para que aqueles que A invocam. A esta Mãe clementíssima devemos o fato de haver suavidade em nossa vida. Ela nos obtém a graça divina e, portanto, forças para a prática da virtude. Ora, a virtude é o que há de doce no existir humano. Sem ela, nossa vida seria amarga e sinistra. Assim, Nossa Senhora é a doçura que, proporcionando-nos a virtude, confere suavidade à nossa existência terrena”.(5)
Esperança nossa, Salve!
Muitas vezes nos decepcionamos por colocar a nossa esperança nas criaturas. Em geral temos muitos amigos, mas, infelizmente a maioria deles costuma desaparecer nas horas de dificuldade e, repentinamente, nos vemos sozinhos diante de nossos problemas, sejam eles de qualquer natureza: doenças, problemas na família, problemas financeiros, etc. “Os amigos verdadeiros e os verdadeiros parentes não se conhecem no tempo de prosperidades, mas sim no das angústias e desventuras. Os amigos do mundo não deixam o amigo, enquanto está em prosperidade. Mas o abandonam imediatamente, se lhe acontece uma desgraça ou dele se avizinha a morte”(6)
Felizes, portanto, aqueles que põem a sua esperança na intercessão de Maria Santíssima! Ela “não é uma esperança nossa; Ela é a esperança nossa. E esperança tal que, só por causa dEla, nossa existência se torna doce e suportável. Mãe de misericórdia, Ela é a vida, a doçura e a grande esperança dos degredados filhos de Eva”.(7)
Encerremos com Santo Afonso de Ligório:
Motivo tem, pois, a Igreja em aplicar a Maria as palavras do Eclesiástico (24,24), com as quais lhe chama a Mãe da santa esperança. Mãe que faz nascer em nós, não a esperança vã dos bens transitórios desta vida, mas a santa esperança dos bens imensos e eternos da vida bem-aventurada. Salve, esperança de minha alma, saudava-a S. Efrém, salve, é segura salvação dos cristãos, auxílio dos pecadores, defesa dos fiéis, salvação do mundo. Aqui pondera S. Boaventura que, depois de Deus, outra esperança não temos senão Maria e por isso a invoca ‘como única esperança depois de Deus’”(8).
Na próxima parte: “A vós bradamos, os degredados filhos de Eva”
1) Catecismo da Igreja Católica. N. 2270, p. 591
2) Ibidem, n. 1254, p. 349.
3) Santo Afonso Maria de Ligório. Glórias de Maria. 3ª. Ed. Aparecida: Santuário, 1989. P.. 74
4) S. Luís Maria G. de MOntfort. Tratado da Verdadeira Devoção à Ssma. Virgem. 38ª. Ed. Petrópolis: Vozes, 2009. P. 82
5) Mons. João Clá Dias, EP. Pequeno Ofício da Imaculada Conceição Comentado. S. Paulo: Artpress, 1997. P. 310.
6) Santo Afonso de Ligório. Op.cit. p. 88
7) Mons. João Clá Dias, EP. Op.cit. p. 287
8) Santo Afonso de Ligório, Op.cit. p. 98
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