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A sensibilidade aos toques da graça

Quem nos dá a honra e a alegria de acompanhar os artigos aqui publicados provavelmente também sabe degustar um bom prato, por exemplo, uma iguaria italiana saborosa, como uma boa pizza mussarela ou calabresa, ou uma lasanha típica, acompanhados de um excelente vinho ou, conforme a preferência de não poucos, de uma cerveja típica alemã ou até brasileira, por sinal várias delas, muito boas. Tudo isto tem seu papel na vida, quando apreciado com temperança e virtude.

Porém, permita-me uma pergunta que talvez surpreenda o leitor: temos esta sensibilidade aos sabores, perfumes, para a boa música, para tantos aspectos naturais apreciáveis criados por Deus e desenvolvidos pela civilização cristã. Contudo, temos esta mesma sensibilidade, num plano superior, para os aspectos espirituais? Como anda caro leitor, nossa sensibilidade para perceber, “saborear” a graça de Deus que continuamente toca a nossa alma?

Consideremos a Solenidade da Epifania do Senhor, num dos seus numerosos aspectos. Narra-nos o evangelista São Mateus (Mt 2, 1-12) a chegada dos três Reis Magos do Oriente para adorarem o Menino Jesus, trazendo seus presentes: ouro, incenso e mirra. Parece tão simples este episódio, que poderia se pensar que os três personagens empreenderam esta viagem como alguém hoje em dia poderia realizar um passeio de viagem de férias, com toda a naturalidade, sem percalços ou riscos, tudo se dando na maior tranquilidade. Não foi isto que se passou com os reis magos: para aquela época, com estradas precárias, onde os assaltantes e animais ferozes ficavam a espreita de cobiçadas vítimas, esta jornada era propriamente uma aventura. Mas eles a empreenderam decididamente. O que os moveu a tal?

Alguém poderá responder: foi a estrela de Belém que apareceu e eles, impressionados, resolveram segui-la. Pode-se, entretanto, objetar: este, como outros sinais – por exemplo, os relatos dos pastores – deram a conhecer o nascimento do Salvador. O mesmo se pode dizer a respeito das inúmeras profecias, inteiramente conhecidas pelo povo judeu. Onde estavam, além dos Reis Magos, estes outros que tomaram ciência de tais sinais? Por que não foram adorar o Menino Deus?

Muito sugestivo e fundamentado em São Tomás, é o comentário de Mons. João Clá, EP, a propósito: “Tanto aos pastores quanto aos Reis, o Espírito Santo falou no fundo da alma, inspirando-lhes a fé no advento do Messias. Com efeito, muitos outros avistaram a estrela, pois ela não fora invisível, e vários conheceram também o relato dos pastores de Belém, na noite de Natal; todavia, nem todos acreditaram, só aqueles que foram favorecidos por moções do Espírito Santo” (1).

E continua o Fundador dos Arautos: “Por isso ressalta São Tomás o papel da graça, como um raio de verdade mais luminoso que a estrela, a instruir os corações dos Magos. É, então, mais importante a comunicação direta do Espírito Santo, do que os meros sinais sensíveis. A tal ponto que, para os justos, como Ana e Simeão, habituados a discernir a voz de Deus em seu interior, não foi necessária a aparição de Anjos ou o surgimento de estrelas, ou qualquer indicação extraordinária de que aquele era o Filho de Deus, o Messias prometido”.

Eis aqui, o mais importante: é a graça de Deus.

Porém, Deus quer de nossa parte, que tenhamos sensibilidade para perceber e compreender a graça do Espírito Santo agindo em nós, ainda quando estas manifestações sobrenaturais não venham com os sinais sensíveis. E para que esta sensibilidade e o nosso sim para com a graça de Deus se façam, é preciso de nossa parte não estarmos voltados às coisas passageiras e efêmeras da terra – conforme a expressão metafórica de São Luis Maria Grignion de Montfort – de modo parecido com os sapos, mas é preciso ter o espírito de águia, para voarmos e contemplarmos as coisas do Céu.

Assim, peçamos que os três Santos Reis Magos nos obtenham, daquela que é a Esposa do Espírito Santo, a graça que eles mesmos receberam e corresponderam: a abertura e a sensibilidade para os toques da graça. Deste modo, assim como estes Reis seguiram a estrela e ofertaram presentes ao Menino, tenhamos fidelidade a todos os desejos e inspirações do Divino Espírito e a entrega completa e amorosa à sua divina ação. (3)

Por Adilson Costa da Costa

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(1) Mons. João S. Clá Dias, EP. O Espírito Santo e nossos maravilhamentos? In: _____. O inédito sobre os Evangelhos. v. I, Coedição internacional de Città del Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, São Paulo: Instituto Lumen Sapientiae, 2013, p. 152
(2) São Luís Maria G. de Montfort. Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem. 42ª ed. Petrópolis: Vozes, 2012, p. 84.
(3) Devocionário Arautos do Evangelho. São Paulo: Edições Loyola, 2007, p. 129-130.

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O Samaritano por excelência: Jesus Cristo

Quando consideramos o próximo vem-nos a mente, já de início – e não sem razão, sobremaneira, por efeito do Batismo que recebemos – aquele que é carente de algum auxílio e em relação ao qual temos alguma proximidade, seja de ordem familiar ou física. E incluímos, nesta “categoria”, o pobre e o doente sem recursos financeiros. Estendendo nossa consideração, será também nosso próximo o necessitado para além do aspecto material, aquele que leva consigo algum sofrimento moral, muitas vezes mais doloroso do que o próprio sofrimento corporal.

E qual deve ser nossa atitude para aqueles que, precisando de auxílio material ou espiritual, passam por nossas vidas? A prática da caridade: “Pois toda a Lei encontra a sua plenitude num só mandamento: ‘Ame o seu próximo como a si mesmo’” (Gl 5, 14). Em outros termos, devemos fazer ao próximo tudo aquilo que esteja ao nosso alcance, da mesma forma que gostaríamos que fizessem conosco, postos nós em tal contingência.

Esta caridade manifesta-se na prática das obras de misericórdia, “ações caritativas pelas quais socorremos o próximo em suas necessidades corporais e espirituais”, conforme nos ensina o Catecismo da Igreja Católica (CIC 2447). E continua o Catecismo: “Instruir, aconselhar, consolar são obras de misericórdia espiritual, como também perdoar e suportar com paciência. As obras de misericórdia corporal consistem sobretudo em dar de comer a quem tem fome, dar de beber a quem tem sede, dar moradia aos desabrigados, vestir os maltrapilhos, visitar os doentes e prisioneiros, sepultar os mortos”. (1)

Sagrado Coração de Jesus – St Mary’s Church – Kitchener, Canadá

Neste sentido, contemplemos o Evangelho do XV Domingo do Tempo Comum, no qual Jesus ensina, através de parábola ao doutor da Lei, no que consiste o amor ao próximo e, portanto, o verdadeiro sentido da Lei.  Conforme comenta Mons. João Clá Dias, EP, “Quantas escolas e cursos de didática se multiplicam por todo o orbe! Entretanto, é impossível superar aquela empregada pelo Divino Mestre em sua vida pública. A criação da figura do Bom Samaritano é simplesmente genial”. (2)

Sim, bem ao contrário do sacerdote e do levita da parábola, face ao pobre homem assaltado por um grupo de bandidos que o maltratam, deixando-o quase morto e o despojam de seus bens. Tanto o sacerdote quanto o levita, passam pelo desventurado agredido e, sem compaixão, não o socorrem ou tomam qualquer providência com vistas a fazer algum bem aquele sofredor.

No entanto, qual a atitude do samaritano? Assim observa Mons. João Clá Dias: “Bem diferente foi a reação do samaritano. Sem levar em conta o ódio racial que violentamente os separava, apesar de se tratar de um inimigo seu, sua religiosa incompatibilidade se transformou, no mesmo instante, em comiseração. O Evangelho recolhe os maravilhosos detalhes da divina parábola elaborada por Jesus para o doutor da Lei: “o samaritano se manifesta um herói da caridade desde o descer de sua montaria, aplicando in loco  todos os cuidados cabíveis naqueles tempos, conduzindo a vítima a uma pousada, até o contraiu uma dívida com o estalajadeiro, a fim de que este dispensasse todos os cuidados ao pobre judeu”. (3)

Eis a caridade, a misericórdia e a bondade belamente retratada por Jesus em relação ao próximo.

Aqui temos a manifestação do amor ao próximo. Para o Samaritano, o próximo foi aquele homem agredido, abandonado e estirado no chão, quase a morrer. Mas, poderíamos perguntar: existirá somente o próximo necessitado? Existirá, por ventura, algum outro próximo? Um próximo esquecido? Para o Samaritano, claro está que o próximo foi o homem de quem ele teve compaixão. Mas, qual será o próximo, na parábola, do homem socorrido? A resposta não poderá ser outra, senão esta: o próximo do homem socorrido foi seu benfeitor, o Samaritano.

Aí esta, em contrapartida e harmonicamente entrelaçado, o sentido do próximo genuinamente manifesto. Se há um próximo necessitado, há também um próximo benfeitor. Para o próximo necessitado devemos ter compaixão, eis como a caridade se manifesta. E para o próximo benfeitor, como deve se manifestar a caridade?

Poderemos responder, imaginando, na parábola, qual a caridade que o homem socorrido deveria ter para com o Samaritano. A resposta salta aos olhos, numa palavra: gratidão! Não poderá ser outra a não ser esta a atitude de amor ao meu próximo benfeitor: gratidão, reconhecimento e admiração para aquele que faz o bem, que me faz o bem.

Mãe do Bom Conselho – Genazzano, Itália

Peçamos a Nossa Senhora da Gratidão não nos esquecermos daqueles nossos próximos que nos fazem o bem: o pai, a mãe, um professor, um amigo, um superior, quiçá um que, embora não o conheçamos particularmente, está perto de nós e que somos objeto de sua caridade… Que sejamos agradecidos, reconhecidos, por todo o bem que deles recebemos, sejam os benefícios materiais, é claro, mas, sobretudo, os espirituais como o bom exemplo, o bom conselho, o ânimo para vencermos nossas dificuldades e adversidades…

Sobretudo, nos lembremos daquele que é o nosso maior e incomparável próximo e benfeitor, o Samaritano por excelência: Jesus Cristo. E qual será nossa gratidão para com Ele: a prática heroica do Mandamento do Amor.

Por Adilson Costa da Costa

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(1) Catecismo da Igreja Católica: n. 2447. 11ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2001, p. 632.

(2) Mons. João S, Clá Dias, EP. Quem é o meu próximo? In: _____. O inédito sobre os Evangelhos. v. VI, Coedição internacional de Città del Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, São Paulo: Instituto Lumen Sapientiae, 2012, p. 219.

(3) Idem, p. 222-223.

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