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A cruz, quando inteiramente abraçada, nos configura com Cristo

Resumo dos Comentários de Mons. João Scognamiglio Clá Dias, no Inédito Sobre os Evangelhos.

É difícil para o homem, no relacionamento com o próximo ou com Deus, agir segundo as exigências de sua consciência, da moral e da verdade. Tomar uma atitude decidida e definitiva constitui uma escolha árdua, pois, por um lado, no interior da alma, chama a voz das más inclinações decorrentes do pecado e, por outro, o convite à retidão, à perfeição e à santidade feito pela graça.

Contudo, quando não é justo, o homem esmorece neste combate ascético e procura encontrar um meio de descansar, desejando alcançar a recompensa eterna sem fazer esforço. São Luis Grignion de Montfort, em sua Carta circular aos Amigos da Cruz, tratou dessa luta interior ao mostrar o glorioso caminho dos eleitos: “O conhecimento experimental do ministério da Cruz é dado a conhecer a muito poucos. Para que um homem suba até o Calvário e se deixe crucificar com Jesus, em meio ao seu próprio povo, necessita ser um valente, um herói, um homem determinado e unido a Deus; que escarneça do mundo e do inferno, de seu corpo e de sua própria vontade; um homem resolvido a sacrificar tudo, a realizar tudo e a padecer tudo por Jesus Cristo. Sabei, queridos Amigos da Cruz, que aqueles que dentre vós não se encontrarem com esta disposição, estes andam com um pé só, voam apenas com uma asa e não merecem estar conosco, porque não merecem ser chamados Amigos da Cruz, a qual devemos amar com Jesus Cristo, com largueza de coração e ânimo generoso.”

O episódio deste domingo é tido como um dos pontos auges do convívio do Salvador com os discípulos e marco importante da instituição da Igreja docente. São Lucas, embora não ofereça maiores especificações geográficas, registra um precioso pormenor na confissão de Pedro e o primeiro anuncio da Paixão: o mestre estava orando.  Dessa vez Nosso Senhor procura um lugar ermo e sem despedir os que O seguiam, afasta-se um pouco deles e entrega-se a uma recolhida oração. Quão insondável e profunda é a oração do Mestre! Nunca conheceremos nesta vida – tão só no Céu – a força impretatória de um pedido Dele, como na comovedora frase “Eu roguei por ti”, pela qual perseverou, não apenas São Pedro mas também cada um de nós.

Interrogando os Apóstolos Nosso Senhor quis ouvir o que diziam Dele. A pergunta possui uma finalidade didática, dando a entender a antecipação de outra mais importante. Sem necessitar de tal testemunho – que já conhecia desde toda a eternidade – Ele procedeu deste modo para trazer à tona a opinião geral, antes de fixar a verdadeira, que de muito a ultrapassava. Na sequência, Nosso Senhor deseja ouvir a opinião dos Apóstolos. Caberia a Pedro, o Apóstolo veemente, decidido e loquaz, a glória de ser o primeiro a proclamar que Jesus era O Filho de Deus encarnado, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade.  Sua percepção, todavia, não poderia ser atribuída à sua mera perspicácia natural, mas sim a uma graça especial para apreender aquilo que a inteligência não alcançava. “Feliz és, Simão, filho de Jonas, porque não foi a carne nem o sangue que te revelou isso, mas meu Pai que está nos Céus”(Mt 16,17). A seguir, ouve a instituição do papado, episódio que faz vibrar a alma Católica.

Enquanto o povo esperava um messias terreno, Nosso Senhor vinha trazendo o resgate da dívida infinita contraída com o Pai pelo pecado, o que nenhum homem, por mais santo e perfeito que fosse, poderia fazer. Para o pleno cumprimento de tão alta missão, era necessária a expiação na Cruz, a imolação do Filhos de Deus. Essa declaração é feita por Jesus com todo o seu realismo. Desse modo, Ele quebra o apoio psicológico depositado em homens de falsa sabedoria, sendo precisamente estes os que tramariam a sua morte. Era chegado o momento de conhecer o plano de Deus ao enviar o Filho Unigênito, uma vez que o Pai desejava conferir-Lhe toda a honra e toda a glória e eles estavam a poucos meses desse acontecimento pinacular.

“Se alguém me quer seguir…”. O convite é explícito, respeitando contudo o livre arbítrio, sem impor-se a ninguém à força. Abraçar a Cruz significa assumir com radicalidade o cumprimento da vocação específica, recebida desde o Batismo. A renúncia de si mesmo em benefício da Glória de Deus torna-se uma exigência da fidelidade a Ele. Com o início das dificuldades de cada dia, em meio à aridez, aos padecimentos físicos ou morais, à perseguição ou atrativos do mundo faz-se necessário abraçar o ideal de segui-lo por amor, tal como o exemplo de Nosso Senhor ao carregar a Cruz com alegria, apesar de estar imerso num oceano de amargura.

Este Evangelho nos propõe um exame de consciência: qual tem sido a nossa postura perante a Cruz com que Nosso Senhor passa diante de nós e nos convida a segui-Lo?

Atualmente a humanidade se utiliza de todos os meios tecnológicos, médicos e sociais para evitar a dor e padece, como nunca, de angústias inenarráveis. Isto se deve a que fugimos da Cruz por desconhecermos a imensa felicidade oferecida por ela quando é abraçada com alegria. Com razão afirma o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira: “A graça do enlevo pelas coisas celestes, pelas coisas de Deus, proporciona a uma pessoa coragem para que ela carregue grandes cruzes como se fossem pequenas. Quer dizer, esse amor latente por Deus, por Nossa Senhora, pelas grandezas do Céu age com tal profundidade no homem que, por um ato de consentimento livre, consciente – e ao mesmo tempo subconsciente, o que parece paradoxal porém verdadeiro –, ele se deixa transformar. E o amor à Cruz é o sintoma desta mudança de mentalidade”.

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