O Terço nas palavras dos Papas e dos Santos – Parte II – Origem do Rosário

Origem do Rosário

Nesta série de artigos, estamos nos propondo a fazer uma leitura, nas palavras dos Papas e dos Santos, sobre a importância do Rosário e a sua atualidade para a vida espiritual dos católicos de hoje. Tendo em vista que muitos ainda desconhecem aspectos históricos desta Devoção, dedicaremos esta segunda parte para tratar, resumidamente, da sua origem. Como o assunto é extenso e nosso espaço é limitado, convidamos aos leitores que desejarem informações mais completas, a estudarem com mais vagar as fontes citadas nas referências, ao final deste artigo.

A devoção ao Rosário, na forma e no método como conhecemos hoje (recitação dos mistérios, através da oração vocal e mental) teve seu início no século XIII, mais precisamente no ano de 1214, segundo narra São Luís Maria Grignion de Montfort em seu livro intitulado O Segredo do Rosário.(1) Aqueles eram tempos difíceis para a Igreja de Cristo, que estava, principalmente na França, sendo assolada por uma terrível heresia, a dos albigenses, cujos erros ameaçavam tomar toda a Europa, pois traziam consigo uma profunda corrupção moral. Os esforços para debelar essa heresia mostravam-se inúteis. São Domingos de Gusmão, fundador da Ordem dos Frades Predicadores, ou Dominicanos, estava também envolvido nessa luta.

Narra o Monsenhor João Clá Dias:

“Dias de aflição terrível foram aqueles! Havia horas em que tudo parecia perdido, e a heresia triunfante tudo destruía, manchava e conspurcava.

“Nesse estado de tribulação extrema da Cristandade, São Domingos, movido por uma inspiração divina, entrou numa grande e profunda floresta próxima de Toulouse (capital do Languedoque), e ali passou três dias e três noites em contínua oração e penitência. Não cessou de gemer, chorar e se flagelar, implorando a Deus que tivesse pena de Sua própria glória calcada aos pés pela heresia albigense.

“Em consequência de tamanho ardor e esforço, acabou por cair semimorto. E eis que então, Maria Santíssima, resplandecente de glória, apareceu-lhe”(2)

Essa sublime manifestação de Nossa Senhora a São Domingos, foi descrita pelo frade dominicano Beato Alano de La Roche (1428-1475), em seu livro Da Dignidade do Saltério (Rosário), o qual é citado por S. Luís Grignion de Montfort:

S. Domingos recebe o Rosário da Santíssima Virgem

Querido Domingos, disse-lhe Nossa Senhora, sabeis de que arma a Santíssima Trindade quer usar para mudar o Mundo? São Domingos respondeu: Oh minha Senhora, vós sabeis bem melhor do que eu, pois depois de vosso Filho Jesus Cristo, vós tendes sido sempre o principal instrumento de nossa salvação.

Nossa Senhora respondeu-lhe: Quero que saibas que a principal peça de combate tem sido sempre o Saltério Angélico que é a pedra fundamental do Novo Testamento. Assim quero que alcances estas almas endurecidas e as conquiste para Deus, com a oração do meu Saltério.

Então, levantou-se [São Domingos] muito consolado, e inflamado de zelo pela conversão dos homens dirigiu-se diretamente á Catedral. Imediatamente, os Anjos invisíveis tocaram os sinos a fim de ajuntar as pessoas e São Domingos começou a pregar.

Assim que iniciou seu sermão, desencadeou-se uma tempestade terrível, a terra tremeu, o sol se escureceu, houve tantos trovões e raios que todos ficaram muito temerosos. Ainda maior foi o seu medo quando olharam a imagem de Nossa Senhora, exibida em local privilegiado, e a viram levantar os braços em direção aos Céus, três vezes, para chamar a vingança de Deus sobre eles, caso falhassem em se converter, arrumar suas vidas e procurar a proteção da Santa Mãe de Deus.

Deus quis, por meio destes fenômenos sobrenaturais, espalhar a nova devoção do Santo Rosário e fazer com que este fosse mais vastamente divulgado”.(3)

Este foi apenas o primeiro de inúmeros prodígios realizados por São Domingos, graças à sua filial devoção e fidelidade a Nossa Senhora.

A Devoção a Maria e ao Rosário produz maravilhas na Igreja

Faz parte, portanto, de uma sólida tradição, narrada por São Luis Grignion de Montfort, citando o Beato Alano de la Roche, que São Domingos foi instado a pregar o Rosário, diretamente pela Mãe de Deus. Durante toda a sua vida, São Domingos foi um incansável propagador dessa Devoção e, como consequência, teve o seu trabalho coroado de êxitos e prodígios, como atesta a fundação e o extraordinário desenvolvimento de sua Ordem Religiosa. Em apenas cinco anos, São Domingos que, no início contava com apenas 16 colaboradores, fundou 60 conventos em toda a Europa, todos eles habitados por jovens entusiasmados e cheios de Fé. De fato, a Ordem dos Dominicanos tem honrado a Igreja com uma quantidade enorme de Santos e Doutores, os quais a serviram na Teologia, na Evangelização, nas Artes e no Governo. Entre esse exército de grandes santos, um Santo Tomás de Aquino, o doutor mais célebre da Igreja Católica; um apostólico e incansável São Vicente Ferrer, o grande Papa São Pio V, o Beato Fra Angelico, cujas obras parecem pintadas por anjos e ainda muitos outros. São tantos os santos dominicanos canonizados que a Ordem tem uma data especial para celebrá-los: dia 07 de Novembro, dia de todos os santos dominicanos. Uma glória para a Igreja! Tudo isso obtido, sem dúvida, pelas graças da fidelidade na pregação e na oração contínua e perseverante do Rosário!

Narra ainda Monsenhor João Clá:

“Desde o tempo em que foi estabelecido até ao ano de 1460, quando o Bem-Aventurado Alano de La Roche renovou esta devoção por ordem do Céu, o Rosário foi chamado de Saltério de Jesus e da Santíssima Virgem, por analogia com o Saltério de David, que contém 150 salmos – o mesmo número de saudações angélicas que compõem o Rosário (atualmente este número subiu para 200, com a introdução dos mistérios luminosos – ver post anterior(4)).

“Apesar de, modernamente, a autenticidade desses fatos ter sido posta em dúvida por vários especialistas, que alegam a ausência de documentos contemporâneos que os atestem, a crítica histórica vem demonstrando o acerto em se considerar São Domingos – fundador dos Dominicanos – como o instituidor do Rosário, e a voz de numerosos Pontífices Romanos o confirmam”(5)

Deus sempre faz a sua parte, derramando Suas graças em profusão, mas, as coisas que dependem da correspondência humana, principalmente, as de natureza espiritual, muitas vezes sofrem com a falta de fidelidade. Assim, após o incentivo inicial de São Domingos, durante mais de um século houve fervor pelo Santo Rosário, mas, aos poucos, esta devoção foi esfriando.

O Beato Alano de La Roche era um frade dominicano do Mosteiro de Dinán, na Bretanha. Foi ele o instrumento do qual Nossa se serviu para trazer de volta, no século XV, o entusiasmo pela devoção ao Rosário.

São Luis Grignion de Montfort, narra que o religioso “iniciou seu nobre trabalho em 1460 após ter recebido os conselhos especiais de Nossa Senhora. Depois ele recebeu a urgente mensagem de Nosso Senhor, tal qual ele mesmo nos conta. Um dia quando estava celebrando a Missa, Nosso Senhor, que queria motivá-lo a pregar o Santo Rosário, lhe disse na Sagrada Hóstia: Como podes Me crucificar novamente tão depressa?

“Como assim, Senhor? – perguntou o Bem aventurado Alano, horrorizado.

“Respondeu Jesus: Tu já me crucificaste uma vez por teus pecados, e Eu de boa vontade seria crucificado novamente ao invés de ver Meu Pai ofendido pelos pecados que tu cometeste. Tu estás a me crucificar de novo agora porque tens todo o conhecimento e compreensão de que precisas para pregar o Rosário de minha Mãe, mas não estás a fazê-lo. Se tu o tivesses feito, terias ensinado a muitas almas o caminho certo e os teria tirado do pecado, mas não estás a fazê-lo e tu mesmo és culpado dos pecados que eles cometem”.(6)

Após essa repreenda, tendo ainda recebido outros avisos, por aparições, de São Domingos e da própria Maria Santíssima, o Beato Alano de La Roche se tornou, a exemplo de seu Fundador, um entusiasmado propagador do Rosário.

São muitos os exemplos de conversão que a Santíssima Virgem concedeu para deixar claro a necessidade e a utilidade da oração do Rosário, desde sua origem até os nossos dias. Também nós somos convidados a renovar a cada dia o nosso amor para com esta devoção, tornando-a, depois da Eucaristia, parte central de nossa vida espiritual. Uma devoção sumamente incentivada pelos Santos e pelos Pontífices.

Na próxima parte: Leão XIII, o Papa do Rosário.

Salve Maria!

Prof. João Celso

Beato João Paulo II rezando o Rosário


1) São Luis Maria Grignion de Montfort. O Segredo do Rosário. Edição. Trad. Geraldo Pinto Faria Jr Belo Horizonte: Ed. Divina Misericórdia, 1997.
2) Mons. João S. Clá Dias. Fátima, O Meu Imaculado Coração Triunfará. 2ª. ed..São Paulo: ACNSF, 2007, p. 93.

3) São Luís Maria G. de Montfort. Op.cit., pág. 13

4) O Terço nas palavras dos Papas e dos Santos. I Parte. Disponível em: http://maringa.blog.arautos.org/2013/06/o-terco-na-palavra-dos-papas-e-dos-santos/
5) Monsenhor João S. Clá Dias, Op. cit. p. 95
6) São Luis Maria G. de Monfort, Op. cit. p. 20