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Santa Maria Eugênia de Jesus: um fruto da pregação

 “Ide, pois, e ensinai a todas as nações”. Com estas palavras, o Divino Salvador conferiu aos Apóstolos a missão de pregar o Evangelho a todos os homens, transformando-os em discípulos de Jesus e, portanto, cumpridores de sua vontade nas vias da santidade para as quais cada um é chamado. Poderíamos, caro leitor, nos perguntar: O quanto a pregação dos ensinamentos do Divino Mestre, feita pela Igreja por meio dos Sacerdotes, constituiu ao longo dos vinte séculos de sua existência um veículo de graças magníficas, suscitando grandes conversões e grandes dedicações?

A esta pergunta, cabalmente teremos uma resposta somente no Juízo Final. Antes, no entanto, podemos conhecer na vida dos Santos alguns exemplos emocionantes. Entre estes, o de Santa Maria Eugênia de Jesus, fundadora da obra da Assunção, destinada a educação de meninas.

Teve esta santa uma vida cheia de contrastes, entre alegrias e tragédias, até sua conversão.

Santa Maria Eugênia de Jesus

Era filha de um pai influenciado pelas idéias de Voltaire, deputado de Mossele, homem abastado, dono de três bancos e de uma esplêndida propriedade. Sua mãe, da nobreza da Bélgica, negligenciava a formação católica fervorosa para os filhos, limitando-se a estimular as virtudes naturais de honestidade e generosidade.

Neste ambiente familiar pouco afeito à religião, Ana Eugênia Milleret de Brou (seu nome de batismo) foi sendo criada em meio aos júbilos de uma vida agradável.

Embora assim vivesse, tendo recebido pela primeira vez a Eucaristia, relembrou mais tarde: “minha ignorância dos dogmas e ensinamentos da Igreja era inconcebível. No entanto, eu participara das aulas de catecismo com os outros meninos, fizera minha Primeira Comunhão com amor, e Deus mesmo me concedera graças que foram, […] o fundamento de minha salvação”.¹

Eis aqui se delineando o valor da pregação e do ensino religioso através das aulas de catecismo. “Ide, pois, e ensinai o Evangelho…” Sim, como é belo aprender aqueles ensinamentos “que estão acima de todos os conhecimentos terrenos, e tais conhecimentos vêm-nos do céu, isto é, são revelados por Deus […] uma luz para a nossa inteligência, porque nos revelam o fim da vida e o caminho que para lá nos conduz”. ²

As tempestades começam por abalar aquela vida despreocupada. Sua família perde a fortuna e os problemas se multiplicam. Fica órfã da mãe aos 15 anos.

Passados certos dramas, começa ela a voltar-se para os prazeres. Sente, entretanto, o vazio de sua existência, de tal forma que, aos 18 anos, assim se expressa: “Meus pensamentos são um mar agitado que me cansa, me pesa. Tanta instabilidade, nunca o repouso, um ardor que sempre ultrapassa os limites do possível. Às vezes, absorvida por questões bem acima do meu alcance e sobre as quais eu faria melhor em não pensar: as mais altas do mundo. Eu queria saber tudo, analisar tudo, e lançando-me em regiões amedrontadas, vou ousadamente interrogando todas as coisas, perseguida por não sei que necessidade inquieta de conhecimento e de verdade, que nada pode saciar”. 4

Eis que afinal chega o momento da graça de Deus tocar profunda e irresistivelmente sua alma. Começa ela a participar das missas dominicais, na Catedral de Notre Dame, conforme costume da sociedade parisiense. Pregava um famoso Sacerdote dominicano, Padre Henri Lacordaire. Juntamente com a graça que recebera na Primeira Comunhão, vieram a constituírem “as palavras [deste Sacerdote] o fundamento de sua salvação”.

Assim escreve ela para o Padre Lacordaire: “Vossa palavra respondia a todos os meus pensamentos, explicava o melhor de meus instintos, completava meu entendimento das coisas e reanimava em mim a idéia do dever, o desejo do bem, já prestes a definhar em minha alma; enfim dava-me uma generosidade nova, uma fé que nada mais devia fazer vacilar”. 5

Tal foi o efeito da graça, através das homilias proferidas por aquele bom sacerdote, que ela pôde assim afirmar: “Minha vocação nasceu em Notre Dame”. 6

Catedral de Notre Dame – Paris

Aqui está caro leitor, um exemplo do valor e benefício sobrenatural da pregação do  Evangelho e dos ensinamentos do Redentor, conforme o magistério infalível da Santa Igreja. É própria a produzir conversões, por obra do Espírito Santo.

Daí porque, no Evangelho de São Mateus, está dito que quem praticar e ensinar os mandamentos será considerado grande no reino dos céus (Mt 5, 19b).

Ana Eugênia procurou o Padre Lacordaire e narrou-lhe as graças eminentes que estava recebendo. Este lhe aconselhou a oração e que esperasse que Deus lhe manifestasse sua vontade a respeito de sua vocação. Mais adiante a jovem conhece o Padre Cambalot, outro pregador cujo zelo a impressiona. Ele ansiava por fundar uma congregação feminina para a educação de meninas e assim combater o laicismo da sociedade da época, problema que Ana também desejava enfrentar. Tocado pelo Espírito Santo, discerniu na jovem entusiasmada e bem pouco instruída em religião a futura fundadora de uma congregação religiosa!

Formada pela palavra e ensinamentos do Padre Cambalot e de outros sacerdotes, Ana Eugênia fez-se religiosa e fundou a Congregação da Assunção, que depois manteve de pé em meio a tremendas dificuldades, graças à grande fé que recebera de Deus por seus pastores e à grande valentia com que a soube defender. Hoje sua fundação, um século após sua morte, tem religiosas atuando na Europa, Ásia, África e nas três Américas, anunciando o Evangelho e educando meninas para viverem a santidade nas famílias e na sociedade, transformando-as rumo ao Reino de Cristo.

Ensinar e praticar. O quanto a graça por meio da pregação pode tocar as almas! No entanto, quanto maior será o fruto da pregação se vier acompanhada da prática daquilo que se ensina! Neste sentido, Mons. João Clá Dias assim explicita:

“Jesus, que dá aos seus ministros o poder de promover a transubstanciação, também lhes dá o de encontrar a palavra exata em benefício das almas. Com efeito, quantas angústias mitigadas, quantos furores apaziguados, quantas dúvidas de consciência resolvidas nos sigilos dos corações, quando Deus fala através de seus sacerdotes! Nisso temos um direito fundamental e sagrado do fiel: o acesso à palavra vivificante do sacerdote”. 7

Esta palavras que penetram fundo nas almas, comenta o Fundador dos Arautos, devem vir robustecidas pelo exemplo de vida do pregador e por sua convicção de que tudo depende da ação da graça divina. “Elas, assim, se tornarão fecundas. Pois a palavra vivificada pelo Espírito nunca é proferida sem produzir os seus efeitos”.

Santa Maria Eugênia de Jesus foi uma destas almas tocadas pela pregação, como ela própria escreveu – Minha vocação nasceu em Notre Dame (com a palavra do pregador) – e tornou-se ela também uma evangelizadora. Que esta santa obtenha de Nossa Senhora, Mãe da Igreja, a graça para todas as almas, até o fim dos tempos, se beneficiarem de pregadores que sempre mais preguem a santidade, pela palavra e pelo exemplo.

Santa Maria Eugênia de Jesus, rogai por nós!

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¹ Germain  Breton. Mère Marie-Eugénie de Jesus: première Supérieure Génerale dês Religieuses de l’Assomption. Saint-Étienne: J. Le lHénaff & Cie, 1922, p. 31.

² Francisco Spirago. Utilidade da Religião. In Catecismo Católico Popular I. Versão feita sobre a tradução francesa do Padre N. Delsor pelo Dr. Artur Bivar. 3ª ed. Lisboa: União Gráfica, 1938, p. 43.

³ Ler o artigo: Santa Maria Eugênia de Jesus – Uma mulher forte. Ir. Maria Teresa Ribeiro Matos, EP. Revista Arautos do Evangelho, número 159, de Março de 2015, p. 31 a 35.

4. Germain Breton, op. cit., p.36-37.

5. Germain Breton, op. cit., p. 38.

6. Idem, ibidem,

7. Mons. João S. Clá Dias. A palavra, seu poder.

http://comentariosdejoaocladias.blogspot.com.br/2014/07/a-palavra-seu-poder.html – Acesso em 11 mar 2015.

 

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A devoção a Nossa Senhora atrapalha a devoção a Jesus Cristo?

Uma das questões levantadas ao longo da História sobre a devoção a Maria Santíssima, formula a seguinte pergunta: a devoção a Nossa Senhora atrapalha, desvia a devoção a Jesus Cristo?

Um belo artigo estampado no Boletim Informativo “Salvai-me, Rainha de Fátima, pela graça de Cristo, Nosso Redentor” nos traz a resposta de forma sucinta, interessante e irrefutável. Vejamos os dois argumentos expostos, muito úteis, aliás, para esclarecermos aqueles e aquelas que, embora piedosos, tem por vezes certa dificuldade em compreender o papel imprescindível da devoção à Mãe de Deus.

Nossa Senhora de Paris – Arautos do Evangelho

Dois pontos são apresentados. O primeiro, por meio da Constituição Dogmática Lumen gentium: “Todo o influxo salvador da Virgem Santíssima sobre os homens se deve ao beneplácito divino e não a qualquer necessidade; deriva da abundância dos méritos de Cristo, funda-se na sua mediação e dela depende inteiramente, haurindo aí toda a sua eficácia; de modo nenhum impede a união imediata dos fiéis com Cristo, antes a favorece” (Lumen gentium, n. 60). [grifos nossos]

Outro argumento no sentido de demonstrar o quanto a devoção a Nossa Senhora é o melhor caminho para se chegar a Jesus Cristo, é explicitado séculos antes por São Luis Maria Grignion de Montfort.

Diz o Santo missionário mariano: “Seria possível que Aquela que achou graça diante de Deus para o mundo inteiro em geral, e para cada um em particular, impedisse uma alma de encontrar a grande graça da união com Ele? Seria possível que Aquela que foi cheia de graça e superabundante de graças, e tão unida e transformada em Deus que este n’Ela Se encarnou, impedisse uma alma de ficar perfeitamente unida a Deus?” (Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem, n. 164).

E conclui São Luis: “Vós, Senhor, estais sempre com Maria, e Maria sempre convosco; nem pode Ela estar sem Vós, pois senão deixaria de ser o que é; de tal modo está Ela transformada em Vós, pela graça, que já não vive, já não existe: sois Vós que viveis e reinais n’Ela, de maneira mais perfeita que em todos os Anjos e Bem-aventurados. […] Maria está tão intimamente unida a Vós que mais fácil seria separar do sol a luz, e do fogo o calor” (idem, n. 63).

Apresentados estes argumentos, mais fácil fica compreendermos o “indispensável papel de Maria na nossa salvação” – conforme salienta Mons. João Clá Dias: “Pois assim como Jesus veio a nós por Maria, é também  por meio d’Ela que obteremos as graças necessárias para sermos outros Cristos e alcançarmos a vida eterna”. ²  [grifos nosos]

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¹ Pe. Juan Carlos Casté, EP. Jesus e Maria, unidos como o fogo e o calor In Boletim Informativo Salvai-me, Rainha de Fátima, pela graça de Cristo, Nosso Redentor, Ano XI, n° 58.

² Mons. João S. Clá Dias, EP. Amanhã, tudo saberemos! In: _____. O inédito sobre os Evangelhos. v. II, Coedição internacional de Città del Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, São Paulo: Instituto Lumen Sapientiae, 2013, p. 172.

 

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“Oh, como é bom, como é agradável para irmãos unidos viverem juntos” (Sl 132, 1)

São João Bosco com os adolescentes

Esta frase do Salmista bem expressa a imagem aqui reproduzida.

Sim, contemplai as fisionomias destes jovens que estão apinhados em torno de São João Bosco. Vede o júbilo, o afeto, o respeito mútuo existente entre o Santo da alegria – outro não era senão seu ensinamento: “santidade é alegria” – e estes jovens. Realmente, como é bom e alegre que os irmãos unidos vivam juntos!

Mas esta realidade – poderia indagar o leitor – somente é possível entre os que moram juntos, numa congregação religiosa?

Para compreendermos bem o quanto isto é possível e realizável na sociedade, seja no relacionamento familiar, social e até profissional, bastará lançar os olhos naquele que é a fonte do verdadeiro amor, da benquerença e do bom trato: Nosso Senhor Jesus Cristo.

É pela presença do Divino Salvador entre os homens que se estabelece a verdadeira amizade. Quando esta presença divina não se faz, entra o orgulho, o desprezo, a inveja, em uma palavra, o egoísmo.

Conta-nos o historiador que os pagãos, nos primórdios do Cristianismo, comentavam admirados a propósito dos primeiros cristãos: “Como eles se amam!”. Sim, estes “imitadores da verdadeira caridade” – na expressão de São Policarpo ¹ – fundavam seu amor ao próximo no amor a Cristo Jesus.

Que os nossos contemporâneos também possam dizer o mesmo de nós, católicos. E dia chegará que a vida, tão marcada de egoísmos e tristezas, será substituída pelas alegrias da verdadeira união fraterna que pressagiam as do Céu, conforme a própria Mãe dos homens assim profetizou em Fátima.

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¹ São Policarpo. In Daniel Rops. A Igreja dos Apóstolos e dos Mártires. Tradução de Emérico da Gama. São Paulo: Quadrante, 1988, p. 190.

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Por que o homem é a obra prima da Criação?

É possível que o caro leitor, depois de um dia fatigante de trabalho, ao entardecer, retornando para o seu lar, tenha em certo ângulo do percurso se deparado com um belo por do sol. Aquele jogo de cores, entre azul e róseo certamente o terá encantado e lhe servido de refrigério psíquico e até, quiçá, espiritual.

Por do sol na Comunidade dos Arautos do Evangelho de Maringá

Ou então, num final de semana repousante, tenha passeado por um jardim zoológico e analisado os diversos animais: ora um pavão, com sua calda prestigiosa, onde o azul prateado e o verde esmeralda se harmonizam esplendidamente, conformidade própria a deixar certos pintores e mestres das artes visuais atônitos com tão curiosa combinação de cores de que a natureza é capaz. Ora um leão, fazendo jus a seu imorredouro título de “rei dos animais”, com seu porte majestoso e calmo, a rugir sonoramente e intimidando as demais criaturas.

Face à variedade aspectos da criação, ficamos muitas vezes admirados. No entanto, caro leitor, você já deve ter formulado a seguinte questão: todas as criaturas, por mais belos reflexos e símbolos que sejam do Criador, comparadas com o homem, são muitíssimo inferiores. Conforme São João Crisóstomo (+404), o grande doutor da Igreja, “é o homem, grande e admirável figura viva, mais precioso aos olhos de Deus do que a criação inteira”. ¹

De onde vem tanta superioridade do homem em relação às demais criaturas visíveis? Por que é o homem “a obra prima da Criação”? ²

A resposta no-la dá o Catecismo: “só o homem é chamado a compartilhar, pelo conhecimento e pelo amor, a vida de Deus. Foi para este fim que o homem foi criado, e aí reside a razão fundamental de sua dignidade”. ³

Sim caro leitor, nós somos criados à imagem e semelhança de Deus e, portanto, capazes de conhecer e amar nosso Criador, enquanto as demais criaturas visíveis não o podem. E esta capacidade de conhecer e amar a Nosso Senhor, guiada pela graça, nos santifica na terra e nos prepara para a felicidade eterna no Céu.

Sagrado Coração de Jesus – Arautos do Evangelho

Por isto mesmo, em seu Diálogo com Deus, a grande doutora da Igreja, Santa Catarina de Sena, com alegria se manifesta: “Qual foi a razão que te levou a colocar o homem em tão sublime dignidade? Certamente o incompreensível amor com que o pensaste e dele te enamoraste! Por amor criaste o homem e lhe deste o ser, desejoso de que saboreasse teu sumo e eterno Bem” 4. Em outros termos, o homem foi criado e chamado para a eterna felicidade, na contemplação de Deus face a face.

E de tal forma o amor de Deus por nós se elevou ao inimaginável que, segundo São João Crisóstomo, Ele atribuiu tanta importância à salvação do homem que nem se quer poupou seu Filho único em nosso favor.5

Assim, caro leitor, quando te vires encantado pelas belezas da criação, lembra-te que o Criador as fez para ti. E que Ele mesmo será a tua recompensa demasiadamente grande, se tu fizeres bom uso das criaturas e viveres na amizade com Deus. Que Nossa Senhora te ajude!

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¹ São João Crisóstomo. Sermão sobre o Gênesis 2, 1.

² Catecismo da Igreja Católica. Tópico n. 343: o mundo visível. 11. ed. São Paulo: Loyola, 2001, p. 100.

³ Catecismo da Igreja Católica. Tópico n. 356: o homem. 11. ed. São Paulo: Loyola, 2001, p. 102

4. O Diálogo, Ed. Paulinas, São Paulo: 2ª. ed., 1984, p. 52.

5. São João Crisóstomo. Idem.

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A religiosa que venceu Átila

Eu não pus a confiança no meu arco

A minha espada não me pôde libertar;

Mas fostes vós que nos livrastes do inimigo

e cobristes de vergonha o opressor. (Salmo 43)

Santa Genoveva – Catedral de Bayeux – França

Históricas e legendárias são as invasões de Átila, “o flagelo de Deus”, que no século V aterrorizava populações com seus guerreiros hunos. A galope sobre cavalos, assaltando rapidamente a China, depois se precipitou sobre a Europa, destroçando o que encontrava pela frente. Quem, no entanto, poderia servir de barreira ou proteção contra tamanha fúria?

Com muita propriedade, pode-se responder com o Salmista: não foi o arco nem a espada que me pôde libertar, mas Deus que me livrou do inimigo (Sl 43, 7-8). E quem poderia imaginar que, entre as almas providenciais suscitadas por Deus no seio da Santa Igreja – “único elemento vivo num mundo em desagregação”¹ – uma delas seria a frágil mulher que deteria Átila e salvaria a cidade de Paris do terrível invasor. Quem foi ela?

Caro leitor, estamos em meados do Século V. Passavam na aldeia de Nantes, a caminho da Grã-Bretanha, em missão dada pelo Papa São Bonifácio I, dois Santos Bispos: São Germano de Auxerre e São Lupo, Bispo de Troyes. Estando eles se dirigindo para a igreja, a população os cercava com veneração e afeto filial, por ter a honra de receber em seu aconchegante lugarejo tão ilustres visitantes.

Santa Genoveva recebe medalha de São Germano, Bispo de Auxerre – por Noel Coypel, Museu de Dijon – França

Eis que em meio à multidão, São Germano discerne uma menina de sete anos, da qual se irradiava, aos olhos sobrenaturais do Santo Bispo, a luz da inocência. Quem seria esta criança? Pediu que chamassem a menina e seus pais. Assim foi feito. E dirigindo-se a eles, disse profeticamente o eminente Prelado:

“Felizes pais com tal filha. Por ocasião do nascimento desta criança, saibam-no, os Anjos deram grande festa no Céu. Esta menina será grande diante do Senhor; e, pela santidade de sua vida, arrancará muitas almas do jugo do pecado.” ²

Ditas estas palavras, acrescentou, com a santa ousadia de um verdadeiro pastor: “Genoveva, minha filha. Fala-me sem temor: gostarias de ser consagrada a Cristo numa pureza sem mancha, como sua esposa?”

E a resposta se fez ouvir, cheia de entusiasmo e candura: “Bendito sejais, meu Pai, o que me pedis é o maior desejo de meu coração. É tudo que quero. Dignai-vos rogar ao Senhor que mo conceda”.

Repleta de luzes é a história de Santa Genoveva. Para não nos alongarmos, fixemo-nos, caro leitor, à abordagem levantada no início deste artigo.

Esta criança, fiel imitadora de Cristo Nosso Senhor, “crescia em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e dos homens” (Lc 2, 52). Fez-se religiosa e, após a morte de seus pais, viveu em Paris. A fama de santidade de Santa Genoveva era generalizada, a tal ponto, que do outro lado do mundo, na Ásia Menor, o famoso santo que vivia rezando sobre uma alta coluna de pedra, São Simeão Estilita, referia-se a ela como sua irmã em perfeição no Cristianismo. ³

Com efeito, os famosos e temidos hunos, comandados por Átila, dirigem-se à Paris, “ultrapassando em ferocidade tudo quanto se possa imaginar, com o seu corpo atarracado, os membros superiores enormes, a cabeça desmedidamente grande, as faces sulcadas de cicatrizes que eles mesmos se infligem para impedir o crescimento da barba, serão feras ou homens? […] Entre eles não há arado, nem cultura, nem casa estável. […] Não se dão ao trabalho de cozinhar os alimentos; comem a carne crua, depois de a terem algum tempo debaixo da sela, para que fique mais macia”, conforme registrou um célebre historiador. 4

Diante dessa horda selvagem e conquistadora a ameaçar Paris, ergue-se, não com arcos, espadas e escudos, mas com a fé e confiança inabaláveis, Santa Genoveva. Muitos querem bater em retirada, no entanto, a religiosa afirma: “Podem os homens fugir, se assim o quiserem e não forem capazes de combater; nós, as mulheres, pediremos tanto a Deus que Ele acabará ouvindo as nossas súplicas!” 5

Tal foi a decisão da Santa que “[…] reunindo as companheiras, aconselhou-lhes dedicar-se aos jejuns, às preces e às vigílias, a fim de lograrem, como Judite e Ester, escapar à calamidade que as ameaçava. Reuniram-se com Genoveva no batistério, e destinaram vários dias a tais obras de penitência. A santa, por outro lado, dizia aos homens que não abandonassem Paris, visto que as cidades para as quais pretendiam retirar-se seriam devastadas pelos bárbaros, ao passo que, com a proteção de Cristo, Paris ficaria [a] salvo.” 6

Diante de tanta fidelidade e confiança em Deus Nosso Senhor, o inopinado aconteceu. Os bárbaros mudaram inexplicavelmente de rota e não invadiram Paris. Aqui está uma das mais belas páginas da vida dos Santos. 7

Que Santa Genoveva nos obtenha do Salvador, unida à Rainha do Céu e da Terra, a confiança inabalável pela qual, sejam quais forem as adversidades e lutas da vida, a graça sempre nos socorrerá, mesmo sem os auxílios dos meios terrenos, nos libertando do inimigo e fazendo-nos aos olhos de Deus verdadeiros heróis da fé e da confiança. Especialmente nestes dias em que a barbárie e a violência retornam requintados à face de um “mundo civilizado” que se distancia de Deus, não coloquemos a confiança no poder das armas, mas saibamos vencer o combate da fé, como Santa Genoveva.

Santa Genoveva, rogai por nós!

 

Por Adilson Costa da Costa

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¹ Daniel-Rops. O furacão dos bárbaros. A Igreja dos Tempos Bárbaros. Tradução de Emérico Da Gama. São Paulo: Quadrante, 1991.  Vol. II, p. 95.

² Dom Guéranger. L’Année Liturgique – Le temps de Noël. Tomo I. 13ª edição. Paris: Librairie Religieuse H. Oudin. 1900, p.. 523-525.

³ Dom Guéranger. Idem.

4 Amiano Marcelino. In Daniel-Rops. O furacão dos bárbaros. A Igreja dos Tempos Bárbaros. Tradução de Emérico Da Gama. São Paulo: Quadrante. 1991. Vol. II, p. 100-101.

5 Daniel-Rops. O furacão dos bárbaros. A Igreja dos Tempos Bárbaros. Tradução de Emérico Da Gama. São Paulo: Quadrante, 1991.  Vol. II, p. 106.

6 Santa Genoveva, Virgem e Padroeira de Paris. Disponível em: <http://www.arautos.org/imprimir/684.html -Acesso em 22/janeiro/2015>. Acesso em 22 jan. 2015.

7 Padre Rohbarbacher. Vida dos Santos. Edição atualizada por Jannart Moutinho Ribeiro sob a supervisão do Prof. A della Nina. São Paulo: Editora das Américas, 1959. Vol. I, p. 126.

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Tão atraente é a vida desta Santa, que vale a pena aprofundar o conhecimento da mesma. Pode-se acessar <http://www.arautos.org/artigo/684/Santa-Genoveva–Virgem-e-Padroeira-de-Paris.html>.

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